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Defensorias Públicas enviam ofício ao Ministério da Saúde pedindo explicações sobre vacinação de gestantes

Defensorias Públicas de 16 estados brasileiros querem explicação do Ministério da Saúde sobre a não inclusão de gestantes como prioridade no plano nacional de vacinação contra covid-19

Mariana Kotscho* Publicado em 19/02/2021, às 00h00 - Atualizado às 15h42

Em junho, pesquisas científicas apontaram que o Brasil é o país com o maior número de mortalidade materna de mulheres que estão morrendo por questões ligadas à Covid-19
Em junho, pesquisas científicas apontaram que o Brasil é o país com o maior número de mortalidade materna de mulheres que estão morrendo por questões ligadas à Covid-19

O Núcleo da Mulher (Nudem) da Defensoria de SP e de mais 15 outras Defensorias do país enviaram esta semana um ofício ao Ministério da Saúde pedindo informações sobre a não inclusão de mulheres grávidas (consideradas  grupo de risco para Covid-19) como prioridade no plano nacional de vacinação. Assinam o documento as Defensorias dos seguintes estados: São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Roraima, Espírito Santo, Rondônia, Santa Catarina, Goiás, Amazonas, Piauí, Tocantins, Rio Grande do Norte, Sergipe e Bahia.

Grávida e homem com as mãos na barriga
Grávidas: grupo de risco para covid-19

De acordo com o documento, a FREBASGO (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia) recomenda que, após avaliação feita pelo médico e pela gestante acerca dos riscos e benefícios da vacina, a vacina possa ser ofertada para as mulheres grávidas.

A Defensora Pública do Estado de São Paulo e coordenadora do Nudem, Paula Machado, explica que os Núcleos de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres vêm acompanhando as consequências da pandemia para as mulheres gestantes, puérperas e lactantes. Em 2020, o Ministério da Saúde incluiu este grupo como um grupo de risco.

Em junho, pesquisas científicas apontaram que o Brasil é o país com o maior número de mortalidade materna de mulheres que estão morrendo por questões ligadas à Covid-19.

“Também estamos acompanhando a confecção do plano nacional de imunização. Inicialmente as gestantes eram contra indicadas, depois o plano as incluiu como um grupo especial, mas ainda, embora reconhecidas como grupo de risco, ainda não foram incluídas no grupo prioritário”, diz a Defensora Paula Machado, e ela completa: “É importante também a gente pensar em mulheres que estão em situação de vulnerabilidade, apesar de não estarem no grupo prioritário, como aquelas que saem para trabalhar, que dependem do transporte público”.

O ginecologista e obstetra Gustavo Kröger disse ao Papo de Mãe que  há vacinas que não podem ser tomadas durante a gravidez, por terem vírus atenuados, como sarampo, rubéola e tríplice viral. Essas colocam mãe e bebê em risco.

Veja também:

A vacina da febre amarela, por exemplo,  deve ser discutida com o médico que vai avaliar riscos e benefícios. Assim também deve ser com a vacina de covid-19. Por ser uma vacina nova, ainda não foi testada em grávidas: “Por ser uma vacina de vírus inativo já sabemos que é mais segura, por ser similar a outras que a gestante deve tomar”.

Segundo a Febrasgo, Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, as gestantes que forem do grupo de risco devem tomar. Pode-se decidir caso a caso, avaliando os riscos da doença. Já é sabido que no final da gravidez, contrair Covid-19 pode ser mais grave porque a capacidade pulmonar da mulher está reduzida.

Leia a íntegra do ofício assinado pelas Defensorias Públicas

Ofício Conjunto NUDEMs nº 001/2021

Ao Excelentíssimo Ministro da Saúde, Sr. Eduardo Pazuello

Ao Ilustre Secretário de Vigilância em Saúde, Sr. Arnaldo Correia de Medeiros

Ao Ilustre Sr. Diretor do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis, Sr. Laurício Monteiro Cruz

À Ilustre Coordenadora- geral do programa nacional de vacinações, Sra. Francieli F. Sutile Tardetti Fantinat

Ref.: Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação Contra a COVID-19

As DEFENSORIAS PÚBLICAS DOS ESTADOS DE SÃO PAULO, PARANÁ,RIO DE JANEIRO, MINAS GERAIS, MATO GROSSO DO SUL, RORAIMA, ESPÍRITO SANTO, RONDÔNIA, SANTA CATARINA, GOIÁS, AMAZONAS, PIAUÍ, TOCANTINS, RIO GRANDE DO NORTE, SERGIPE e BAHIA, por meio dos Núcleos Especializados de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (NUDEM) abaixo assinados, instituições essenciais à função jurisdicional do Estado, a quem incumbe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, dos necessitados, vêm, com fundamento no art. 134 da Constituição Federal, no art. 3º-A, I e III, e no art. 4º, I, VII, X e XI, da Lei Complementar 80/94, vêm, em face do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação Contra a Covid 19 do Ministério da Saúde, de 22 de janeiro de 2021,tópico 4.1.2, página 27, Grupos especiais – Gestantes, Puérperas e Lactantes e expor e questionar o quanto segue.

Em abril de 2020 o Ministério da Saúde, através do “Protocolo de Manejo Clínico do Covid-19 na Atenção Especializada”, definiu que grávidas em qualquer idade gestacional, puérperas até duas semanas após o parto (incluindo as que tiveram aborto ou perda fetal) fariam parte do grupo de risco por infecção da COVID 19[1].

Em julho de 2020 a FEBRASGO (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia) emitiu Nota Pública manifestando preocupação com relação ao alto número de mortes maternas decorrentes da COVID-19[2] com base nos seguintes dados:

Na última semana, uma publicação no International Journal of Gynecology and Obstetrics, utilizando os dados do SIVEP-Gripe, reportou a ocorrência de 124 óbitos maternos no Brasil entre janeiro e 18 de junho de 2020. Esse número de mortes maternas deverá representar um incremento de pelo menos 7% na já elevada razão de mortalidade materna do Brasil no corrente ano. Adicionalmente, esse número de morte materna é 3,5 vezes maior que a soma do número de mortes maternas por COVID-19 reportado em outros países até o momento, o que deve observado com muito cuidado pelas autoridades sanitárias nacionais. O referido artigo aponta ainda potenciais demoras na assistência a essas mulheres, já que 22% dos casos fatais não foram internados em UTI e 14% não receberam nenhum tipo de suporte ventilatório.

Na data de 18 de janeiro de 2021, a FEBRASGO, através da Comissão Nacional Especializada em Vacinas, emitiu Recomendação sobre a vacinação de gestantes e lactantes em relação as vacinas aprovadas para uso emergencial no Brasil[3].

A referida RECOMENDAÇÃO contém o seguinte teor:

Com a autorização da ANVISA e revisão de literatura, a Febrasgo recomenda: A segurança e eficácia das vacinas não foram avaliadas em gestantes e lactantes, no entanto estudos em animais não demonstraram risco de malformações.

Para as gestantes e lactantes pertencentes ao grupo de risco, a vacinação poderá ser realizada após avaliação dos riscos e benefícios em decisão compartilhada entre a mulher e seu médico prescritor.

As gestantes e lactantes devem ser informadas sobre os dados de eficácia e segurança das vacinas conhecidos assim como os dados ainda não disponíveis. A decisão entre o médico e a paciente deve considerar: o nível de potencial contaminação do vírus na comunidade; a potencial eficácia da vacina; o risco e a potencial gravidade da doença materna, incluindo os efeitos no feto e no recém nascido e a segurança da vacina para o binômio materno-fetal.

Logo em seguida, no dia 22 de janeiro, o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação Contra a COVID-19 do Ministério da Saúde[4] foi atualizado e as gestantes, puérperas e lactantes que até então pertenciam ao grupo de contraindicações à administração da vacina passaram a pertencer ao “Grupo Especial”, conforme abaixo descrito:

A segurança e eficácia das vacinas não foram avaliadas nestes grupos, no entanto estudos em animais não demonstraram risco de malformações.

Para as mulheres, pertencentes a um dos grupos prioritários, que se apresentem nestas condições (gestantes, lactantes ou puérperas), a vacinação poderá ser realizada após avaliação cautelosa dos riscos e benefícios e com decisão compartilhada, entre a mulher e seu médico prescritor.

As gestantes e lactantes devem ser informadas sobre os dados de eficácia e segurança das vacinas conhecidos assim como os dados ainda não disponíveis. A decisão entre o médico e a paciente deve considerar:

O nível de potencial contaminação do vírus na comunidade;

A potencial eficácia da vacina;

O risco e a potencial gravidade da doença materna, incluindo os efeitos no feto e no recém-nascido

Na data de 27 de janeiro, a Sociedade Brasileira de Pediatria emitiu o documento “Guia Prático de Atualização” que as sociedades científicas recomendam que devido ao risco maior de complicações apresentado pelas gestantes elas deverão ser vacinadas[5].

Ademais, os dados disponíveis sugerem que grávidas sintomáticas com COVID-19 tem risco aumentando de doença mais grave em comparação com mulheres não grávidas[6]. E, por fim, o Brasil é o país com mais mortes de gestantes por Covid-19 do mundo[7].

Diante do exposto, considerando que o Ministério da Saúde definiu que as grávidas em qualquer idade gestacional, puérperas até duas semanas após o parto (incluindo as que tiveram aborto ou perda fetal fazem parte do grupo de risco da Covid-19) pertencem ao grupo de risco; os altos índices de morte maternas no Brasil por causa de infecção pela COVID 19; e as manifestações da Febrasgo e da Sociedade Brasileira Pediatria, questiona-se por quais razões e evidências científicas este grupo não foi incluindo como prioritário no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação Contra a COVID-19 do Ministério da Saúde e se existe alguma previsão de vir a ser incluído.

Solicitamos que a resposta a este ofício seja encaminhada para os seguintes endereços de e-mail: [email protected] e   [email protected], no prazo de 10 (dez) dias.

Por fim, coloca-se à disposição para contribuir com o debate relacionado à matéria e esclarecimentos que se fizerem necessários.

Paula Sant’Anna Machado de Souza

Defensora Pública do Estado de São Paulo

Coordenadora do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (NUDEM)

Nalida Coelho Monte

Defensora Pública do Estado de São Paulo

Coordenadora Auxiliar do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (NUDEM)

Lívia Martins Salomão Brodbeck

Defensora Pública do Estado do Paraná

Coordenadora do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher (NUDEM)

Maria Matilde Alonso Ciorciari

Defensora Pública do Estado do Rio de Janeiro

Coordenadora do Núcleo de Defesa dos Direitos da Mulher Vítima de Violência de Gênero (NUDEM)

Samantha Vilarinho Mello Alves

Defensora Pública do Estado de Minas Gerais

Coordenadora da Defensoria Especializada na Defesa dos Direitos da Mulher em Situação de Violência de Belo Horizonte (NUDEM-BH)

Thaís Dominato Silva Teixeira

Defensora Pública do Estado de Mato Grosso do Sul

Coordenadora do Núcleo Institucional de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher (NUDEM)

Terezinha Muniz de Souza Cruz

Defensora Pública do Estado de Roraima

Chefe da Defensoria Especializada de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher

Fernanda Prugner

Defensora Pública do Estado do Espírito Santo

Núcleo de Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo

(NUDEM/ES)

Débora Machado Aragão

Defensora Pública

Coordenadora do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher – NUDEM/DPE-RO

Anne Teive Auras

Defensora Pública do Estado de Santa Catarina

Coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher (NUDEM/DPE-SC)

Gabriela Marques Rosa Hamdan

Defensora Pública

Coordenadora do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher – NUDEM/DPE-GO

Pollyana Souza Vieira

Defensora Pública

Núcleo de Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública do Estado do Amazonas (NUDEM/AM)

Lia Medeiros do Carmo Ivo

Defensora Pública

Coordenadora do Núcleo de Defesa da Mulher em Situação de Violência – PIAUÍ

Silvânia Barbosa de Oliveira Pimentel

Defensora Pública

Coordenadora do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher – NUDEM/DPE-TO

Maria Tereza Gadelha Grilo

Defensora Pública

Núcleo de Defesa da Mulher Vítima de Violência Doméstica e Familiar de Natal – NUDEM/RN

Elvira Lorenza Quaranta Leite

Defensora Pública do Estado de Sergipe

Coordenadora do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher-NUDEM/SE

Lívia Silva de Almeida

Defensora Pública Estadual

Coordenadora do Núcleo de Defesa das Mulheres da Defensoria Pública do Estado da Bahia

[1]      1Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manejo_clinico_covid19_atencao_especializada.pdf. Acesso 10.02.2021

[2]      Disponível em: https://www.febrasgo.org.br/pt/noticias/item/1067-nota-oficial-de-alerta-as-mortes-maternas-associadas-a-covid-19. Acesso 10.02.2021

[3]      Disponível em: https://www.febrasgo.org.br/pt/noticias/item/1207-recomendacao-febrasgo-na-vacinacao-gestantes-e-lactantes-contra-covid-19. Acesso 10.02.2021.

[4]      Disponível em: Microsoft Word – PlanoVacinaçãoCovid_v2_22jan2021_nucom.docx (www.gov.br). Acesso em 10.02.2021.

[5]      Disponível em: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/22909c-GPA-Duvidas_sobre_Vacinas_COVID19.pdf. Acesso 10.02.2021.

[6]      Disponível em: Ellington MMWR 2020 , Collin 2020 , Delahoy MMWR 2020 , Panagiotakopoulos MMWR 2020 , Zambrano MMWR 2020. Acesso 10.02.2021.

[7]      Disponível em: https://obgyn.onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/ijgo.13300. Acesso 10.02.2021.

O Outro lado

O Ministério da Saúde ainda não respondeu a este ofício das Defensorias Públicas.

*Mariana Kotscho é jornalista e apresentadora do Papo de Mãe

Assista ao vídeo sobre vacinação de gestantes contra a covid-19:


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