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Vamos falar sobre pais ausentes?

Advogada traz dados e explica aspectos da lei que retratam os pais ausentes e as consequências disso para os filhos

Sabrina Legramandi* Publicado em 08/08/2021, às 07h00

Para advogada, paternidade deve ser repensada na esfera pública e na privada
Para advogada, paternidade deve ser repensada na esfera pública e na privada

O Dia dos Pais é uma data criada para celebrar a figura paterna, mas também deve ser uma data de reflexão sobre o impacto dos pais ausentes na vida dos filhos. Afinal, para além de ser apenas uma figura de "apoio" para a mãe, o pai que verdadeiramente assume a paternidade, também assume a responsabilidade de cuidar dos filhos. Em grande parte das vezes, porém, isso não ocorre.

Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), cerca de 37% dos domicílios brasileiros são chefiados por mulheres. Além disso, o Instituto também já mostrou que, em 2019, 62,4% das mulheres, em caso de divórcio, acabam ficando com a responsabilidade unilateral de ficar com os filhos. No caso dos homens, o número fica em torno de 4% e, caso a guarda seja compartilhada, em 26,8%

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Marilia Golfieri Angella, advogada especializada em direitos da mulher, da criança e do adolescente explica que o resultado de tudo isso é a sobrecarga da mulher, que fica encarregada de cuidar dos filhos, independentemente da circunstância. 

A advogada Marilia Golfieri Angela
Marilia Golfieri Angela, advogada especialista em direitos da mulher, da criança e do adolescente – Foto: Divulgação / Ela Comunica

Espera-se que a mãe 'vá dar um jeito', seja para pegar os filhos na escola ao final do expediente de trabalho, seja para colocar comida na mesa, mas não se tem essa mesma expectativa em relação aos pais." (Marilia Golfieri Angella)

Para ela, a paternidade precisa ser repensada, tanto na esfera pública quanto na privada. A advogada explica que a ausência paterna e, consequentemente, a falta de apoio afetivo e material impacta diretamente no desenvolvimento físico e psíquico dos filhos, especialmente na primeira infância.

A função paterna e a justiça

Marilia comenta sobre dados alarmantes em relação à figura paterna na vida dos filhos. Em 2010, por exemplo, o Conselho Nacional de Justiça havia criado o "Programa Pai Presente", que buscava reconhecer a paternidade de pessoas que não tinham esse registro. Em cinco anos, mais de 150 mil mulheres procuraram o Poder Judiciário para o procedimento de declaração de paternidade dos seus filhos.

Ainda falando sobre procedimentos no Judiciário, a advogada conta que o assunto "Alimentos" esteja entre os dez mais demandados em ações judiciais, segundo o relatório Justiça em Números.

Para ela, a própria justiça permite que os pais se "esquivem" do convívio dos filhos em disputas familiares. Como exemplo, Marilia Angella cita a enorme desproporcionalidade do tempo da licença maternidade e da paternidade.

Esperamos das mulheres o papel de cuidado e dos homens o de 'apoio', mera ajuda momentânea e pontual em um momento absolutamente crítico como o pós-parto e o puerpério." (Marilia Golfieri Angella)

Certas decisões, como, no caso de separação, decidir que o pai vá apenas quinzenalmente visitar os filhos e seja obrigado ao pagamento de uma pensão fixa mensal que, de acordo com a advogada, não respeita as necessidades individuais da criança ou do adolescente, faz com que as responsabilidades entre a figura paterna e a figura materna fiquem desiguais.

Marilia afirma que todos esses aspectos são retrato de um machismo estrutural que atinge o Sistema Judiciário.

Como lutar por uma paternidade real?

Marilia Golfieri diz que uma paternidade justa já está estampada na Constituição Federal: o primeiro passo é fazer com que ela faça parte da sociedade e também que a proteção dos direitos infanto-juvenis seja uma prioridade.

Além disso, cobrar presença e apoio de pais que se fazem ausentes na criação dos filhos deve ser uma responsabilidade de todos, não apenas do Sistema de Justiça. A advogada argumenta que, diferentemente de uma mãe que abandona o filho, material ou afetivamente, o pai que toma a mesma atitude sequer é acionado pela família ou pelo Judiciário.

Precisamos efetivamente julgar e cobrar pais ausentes, mesmo em rodas de conversas informais com amigos e colegas de trabalho, por exemplo. O abandono de filhos não é algo aceitável. É cruel." (Marilia Golfieri Angella)

*Sabrina Legramandi é repórter do Papo de Mãe

Confira o Papo de Mãe sobre as consequências afetivas e sociais provocadas pela ausência do pai:

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