Papo de Mãe
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O que seu filho precisa para crescer resiliente?

A importância de valorizar seu filho por quem ele é

Adriana Drulla* Publicado em 28/06/2021, às 15h05

O autoconceito positivo da criança e do adolescente para enfrentar desafios
O autoconceito positivo da criança e do adolescente para enfrentar desafios

Nossos filhos não nos terão por perto para sempre. Encontrarão imprevisibilidade, incerteza, problemas de relacionamento, crises políticas, econômicas, sociais e ambientais. Tomarão as rasteiras da vida. E nessa hora, eles precisarão saber que são fortes para levantar. A resiliência é a nossa capacidade de enfrentar desafios e sair deles melhor, ou pelo menos igual, entramos. É a nossa capacidade de superar momentos difíceis, momentos de transição, de perda, de trauma, momentos como a pandemia que estamos enfrentando.

E os estudos demonstram que a resiliência não é igual à cor do cabelo ou dos olhos, que são determinados pela genética e que não conseguimos mudar. A resiliência pode ser aprendida. Podemos pensar na resiliência como se ela fosse um prédio. E a fundação desse prédio é construída na infância. Ter um prédio com uma fundação forte não quer dizer que você não vai ter problemas mais tarde, eventualmente você pode encontrar um problema elétrico, uma infiltração. Mas se você construir um prédio com uma fundação fraca, a tragédia é quase que inescapável, muito mais grave, e infelizmente uma questão de tempo.

Então, para que seu filho construa uma fundação forte, que possa suportá-lo e permitir que ele cresça a partir de desafios, é importante refletir sobre como você pode ajudá-lo a construir os pilares da resiliência. Nesta série de artigos, vamos discutir cada um deles começando pelo autoconceito positivo, que alguns chamam de autoestima.

É importante considerar-se intrinsecamente valioso

A criança que sabe o valor que tem, consegue ter uma visão realista dos problemas em vez de achar que os problemas acontecem porque ela é incompetente. Ou seja, eu não sou um fracasso, apenas fiz uma escolha infeliz. As crianças que têm um autoconceito positivo usam menos álcool e drogas, vão melhor na escola, e tem mais sucesso na vida. E as pesquisas mostram que um dos principais fatores que determinam esse autoconceito positivo da criança e do adolescente é como eles percebem que os pais os veem. Ou seja, se a criança percebe que seu pai e sua mãe a valorizam, ela se valoriza também. É a partir deste lugar que ela começa a se relacionar com o mundo.

E se sentir amado, aceito e valorizado é diferente do que ser amado. Pesquisas mostram que existe uma incompatibilidade entre o relato da criança sobre como ela sente que os pais a veem, e o relato dos pais a respeito de como eles veem os seus filhos. E muito dessa incompatibilidade tem a ver com a nossa comunicação com os filhos e a forma que educamos a criança.

Muitas vezes usamos estratégias de educação que condicionam o valor da criança ao sucesso e ao acerto. Por exemplo, castigamos ou criticamos a criança por seus erros. Ou então, na tentativa de inibir maus comportamentos, julgamos e apontamos o dedo para que a criança entenda que o que ela fez não foi legal. Como se a criança errasse por escolha. Como se nós, mães e pais, acertássemos sempre. Muitas vezes o erro é resultado da falta de recursos para lidar com emoções, o que é natural na infância. Crianças tem menos experiência de vida e um cérebro menos maduro. Elas têm mais dificuldade na autorregulação. Na maioria das vezes, na hora do erro, a primeira coisa que o seu filho precisa saber é que ele continua sendo amado e aceito apesar de suas falhas. Que ele ainda tem valor para você. Ele precisa saber que ele fez algo ruim, mas isso não significa que ele seja ruim. Depois disso, podemos refletir juntos sobre como ele pode fazer melhor da próxima vez, ou como ele pode consertar os prejuízos que causou. Quando desvalorizamos a criança por suas falhas, ensinamos que o valor dela está condicionada ao acerto. Dificultamos que ela tenha um autoconceito positivo já que, por definição, ela é imperfeita.

Criança não precisa de conserto

Pais e mães têm expectativas a respeito dos filhos. E quando os filhos não são bons em algo que os pais julgam importante, é comum que eles queiram consertar a criança. Como resultado, a criança entende que precisa mudar para agradar os pais. Ela fica obcecada com as próprias fraquezas em vez de reconhecer o potencial que ela tem.

Por exemplo, para motivar a mudança de comportamento, pais e mães costumam comparar os filhos. É comum comparar um filho com o outro, ou com outra criança mais comportada, mais dedicada, mais estudiosa. A ideia por trás da comparação é motivar a criança a seguir o bom exemplo, mas o que acontece é bem diferente disso. A criança entende que ela não é boa o suficiente para ter o seu amor e admiração. Além disso, ela aprende a comparar-se com o outro, um dos piores hábitos para a autoestima.

Outra tentativa comum para moldar os filhos é dando rótulos para eles. Explicamos como eles são tímidos, agressivos, desatentos ou impacientes. Suplicamos para mudarem e mostramos evidências de como podem ser infelizes se escolherem seguir por maus caminhos. De novo o tiro sai pela culatra. Quando usamos um adjetivo para qualificar a criança, por exemplo dizendo que ela é tímida, ela acredita que o rótulo a define. Além de se sentir inadequada e insuficiente, o rótulo pode inclusive inibir a mudança que você deseja. Por exemplo, a criança pode deixar de se arriscar socialmente porque já se identifica como tímida.

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A idealização é inimiga do amor

Se em casa sua filha aprende que ela é amada exatamente como ela é, e que ela não precisa ser diferente para ter amor, então navegar o mundo fica mais fácil. E aqui é importantíssimo dizer que, sermos amados e valorizados pelo que somos, é diferente do que percebermos que nossos pais amam uma versão idealizada de nós. Muitas vezes, os pais sobrevalorizam o que a criança faz bem, ignoram os seus erros e defeitos, e constroem uma imagem que não corresponde a quem a criança é de fato. A imagem da criança perfeita.

É claro que a criança endeusada gosta de estar em seu pedestal. Porém, sustentar este lugar tem um custo altíssimo. Deuses não têm imperfeições. Quando a criança sente que o valor dela está associado ao seu brilhantismo e grandiosidade, qualquer sinal de fraqueza se torna extremamente aversivo. A pressão para ser perfeita faz com que ela crie falsas expectativas sobre si mesma. Fica mais difícil admitir fraquezas sem sentir vergonha. Os erros passam a ser um atestado de incompetência. Mas, para filhos humanos acertar sempre é impossível. A idealização prejudica o autoconceito e a autoestima. Além disso, a criança deixa de assumir novos desafios. Tentar coisas novas é condição para desenvolvermos nossas habilidades, mas quando você não pode errar, a zona de conforto será sempre preferida.

A idealização cria uma versão especial e fictícia da pessoa que você acredita amar. O amor exige o reconhecimento de que a criança que está na sua casa é diferente daquela que habita os seus sonhos. A criança real é uma criança normal, que tem qualidades, mas também defeitos, fraquezas e limitações. Sentir-se verdadeiramente amado é saber que você é aceito por quem você realmente é, defeitos inclusos. As crianças sabem que elas não têm apenas qualidades.

Quando a resiliência começou a ser estudada, nos anos 60 e 70, os pesquisadores perguntaram para várias pessoas de sucesso, mas com infâncias difíceis, sobre qual foi o principal fator que ajudou com que elas chegassem em uma posição de destaque. E o que as respostas tiveram em comum foi a presença de um adulto amoroso, que acreditou no potencial dessas pessoas e as apoiou. É importante valorizar as qualidades e os talentos que o seu filho possui. Mas também é importante ajudá-lo a lidar com as fraquezas que ele tem e com as decepções a respeito de si mesmo, com as partes de si que ele não escolhe. É importante ensiná-lo a reparar os erros sabendo que falhas não são prova de incompetência ou inferioridade, mas provas de que ele também é humano. É importante agir de uma forma que comunique para a criança que ela não precisa se tornar perfeita, em realidade ou fantasia, para que tenha o seu amor.

*Adriana Drulla, mestre em Psicologia Positiva pela Universidade da Pensilvânia e especialista em Parentalidade Consciente.

Assista ao Papo de Mãe sobre autoestima. 

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