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O pós-parto do pai

O bebê chegou e além de todas as novidades deste momento, existe também o pós-parto paterno, que merece atenção

Anna Mehoudar e Eva Wongtschowski* Publicado em 30/04/2021, às 00h00 - Atualizado às 11h23

O pós-parto paterno merece atenção
O pós-parto paterno merece atenção

Por que considerar o impacto psíquico da gestação e do pós-parto apenas para as mulheres, se os homens também vivem impactos psíquicos e somáticos?

As funções materna e paterna não dependem da biologia e podem ser assumidas por casais homoafetivos, sejam eles de homens ou mulheres. As mães sem parceiros podem exercer uma função paterna junto à criança, e mesmo eleger figuras de referência.

Seja na paternidade desejada ou temida, imaginada ou realizada, os homens apresentam uma maior vulnerabilidade psíquica. E em diferentes momentos e de diferentes formas, seus corpos também são afetados. O homem pode ficar mais dolorido, pode engordar, ter dores de barriga, mais sono, dores de cabeça, maior irritabilidade etc.

O mercador veneziano Marco Polo relata que na China do século XII os maridos, logo após o parto de suas esposas, ficavam 15 dias com ela e o bebê na cama, ele cuidando do bebê, ela apenas amamentando. Havia uma extensão para o pai da dinâmica e das proibições impostas à mulher no pós-parto.

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Muitos pais ficam presentes e próximos, enquanto as mulheres ficam mais instáveis e sensíveis no pós-parto. O bebê quando nasce conhece a voz materna, seu ritmo, seus movimentos, seu cheiro. A mãe apresenta o pai para o bebê, e ele é o terceiro na relação dual mãe e filho, muitas vezes impedindo que a mãe faça uma fusão excessiva, prolongada no tempo, e mesmo perniciosa para a criança. O pai pode exercer uma função fundamental na saúde mental da criança, e da família.

A identidade masculina não se confunde mais com força física, virilidade, agressividade. Abre-se assim, a possibilidade de explorar novos espaços, antes associadas apenas à maternidade. Pais alimentam, cuidam, brincam, ninam, educam, levam para a escola ou ao médico. A relação entre homens e mulheres se enriqueceu, e também se tornou mais complexa. Alguém duvida?

Pai presente

O novo pai não espera ser chamado, ele quer exercer um protagonismo junto à criança. A presença real do bebê, sua fragilidade e dependência, pedem uma nova organização do casal parental. É desejável que a mulher tome o homem como parceiro, e entenda que ele não vai cuidar do bebê exatamente do mesmo jeito que ela. Ainda bem, não? Da mesma forma, é importante que pessoas próximas possam ajudar, seja nos cuidados com a casa, na alimentação, na presença junto ao bebê para que mãe e pai possam descansar e mesmo dormir. Com todas as dificuldades da pandemia, vale a pena convocar avós e familiares próximos – desde o final da gestação – para combinar como podem colaborar com a família, sem deixar de atender a rigorosos protocolos de segurança.

O pós-parto impõe uma revolução na rotina da casa e ocupa várias horas do dia e da noite, além de uma sobrecarga mental / emocional. Há um sentido de urgência – protagonizado pelo bebê, que exige prontidão por parte dos adultos. O recém-nascido não consegue esperar quando sente algum desconforto, ele chora e chora muito e no início, nem mãe, nem pai sabem exatamente como acalmá-lo.

Por vezes é difícil para o homem responder a esse sentido de urgência que é do bebê, mas também da mulher, que passa a solicitar um cuidado, quase materno, por parte do parceiro. Assim, todos tendem a ficar exaustos e irritados…

Alguns homens, por sua vez, querem ser cuidados, e não cuidar. Muitos pais sofrem com tantas exigências, e com a proximidade entre a mãe e o bebê e isso tudo faz com que fique ainda mais difícil encontrar o seu lugar. A experiência do home office permite avaliar o trabalhão que dá cuidar dos filhos.

No início da vida tudo fica bastante bagunçado. O problema maior é quando o homem não se interessa e não se vê cuidando do bebê, quando se dedica demasiadamente ao trabalho e fica “plugado” horas a fio nas telas. E, ainda, quando ele procura a mulher amante, ela nem sempre está disponível. Daí começam as cobranças, as discussões e a decepção de lado a lado. De alguma forma o pai rivaliza com o bebê, na busca por atenção e cuidados, e a mulher se sente desrespeitada.

Quando quer o filho e gosta de cuidar, o homem por vezes disputa com a mulher quem é mais competente. Nessa hora, não se trata de competir, mas de reconhecer que são funções e formas de cuidar diversas. O lugar do pai, podemos concordar, não é nada fácil!

Somar competências, conversar e certa dose de humor são bons caminhos nos cuidados com bebês e crianças maiores. Aos poucos, e no melhor cenário, o casal reencontra seu espaço em comum e fica difícil lembrar como era a vida antes dos filhos.

*Anna Mehoudar e Eva Wongtschowski são psicanalistas. Saiba mais em Gamp21.

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