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Meus filhos não estão bem

Um ano de isolamento e traumas que podem durar para sempre

Monica Romeiro* Publicado em 15/04/2021, às 00h00 - Atualizado às 13h58

Lucas, 10 anos, Larissa, 8 anos, e Monica
Lucas, 10 anos, Larissa, 8 anos, e Monica

Já estamos há mais de um ano em isolamento social, o que era para durar duas semanas se estendeu tanto que nossos planos foram adiados, nossas famílias separadas, nossas escolas fechadas e, em muitos casos, nossos empregos e negócios destruídos.

Se para nós, adultos, está complicado, imagine para nossas crianças. Recebo, diariamente, relatos de mães contando que os filhos estão regredindo em suas habilidades motoras e emocionais, que voltaram a fazer xixi na cama, que se irritam com facilidade, que desenvolveram medos, agressividade, estão ansioso, entre outros comportamentos que nos mostram que eles não estão bem.

Aqui em casa não é diferente. Sou mãe do Lucas de 10 anos e da Larissa de 8 anos.

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Meu filho está com medo durante o banho

Lucas
Medo de ficar sozinho no banheiro

O Lucas, de uns meses para cá, começou a reclamar que estava sentindo medo de tomar banho sozinho, mas mesmo com medo ele continuava a tomar, sem problemas, até três semanas atrás. Com os olhos cheios de lágrimas ele conta que tem consciência de que nada de ruim vai acontecer, mas não consegue mais controlar este medo de ficar sozinho no banheiro, e pede para que alguém fique por perto durante seu banho. Ele diz que começa a ouvir passos e sente que alguém irá ataca-lo. Mas isto só acontece durante o banho, ele continua sem qualquer problema para dormir em seu quarto, sozinho.

Minha filha está se sentindo sozinha

Lari
Choro no quarto

Já a Lari, que desde o começo do isolamento reclama da saudade das amigas, teve uma melhora quando as aulas presenciais voltaram, duas vezes por semana, mas com o último fechamento das escolas que aconteceu na capital paulista, tudo piorou. Ela me interrompe durante toda a tarde para entregar cartas de amor, para mostrar pinturas e qualquer coisa que possa chamar minha atenção. Ao fim do dia se fecha em seu quarto para chorar, dizendo que está se sentindo sozinha.

Diferentes formas de expressar as consequências do isolamento social nas crianças

Duas formas diferentes dos meus filhos expressarem a mesma coisa: suas angústias e falta de convívio com outras crianças. Suas liberdades tolhidas sem previsão de quando tudo vai voltar a ser como antes. Apenas a promessa de que logo vai passar.

E quanto mais crescidos, mais eles entendem sobre os riscos da doença. Mas eles sentem medo e observam o nosso medo. A gente pode até não demonstrar, mas nossos filhos sabem, afinal o uso das máscaras por todos, o álcool em gel em cada canto e as incansáveis lições sobre lavar as mãos, manter distância das pessoas, sem abraços e até sem levar as mãos ao rosto, mostram que tem alguma coisa perigosa acontecendo.

Sim, está difícil para todos, mas eu consigo lidar com esses problemas, desde que meus pequenos estejam bem. Vê-los com todos esses medos, inseguranças e angústias me destrói.

Reconheço que tenho meus privilégios por já trabalhar em casa desde que eles nasceram, de ter meu marido trabalhando em casa temporariamente, mas principalmente por ainda termos nossos trabalhos e não precisarmos da escola ou de uma babá para cuidar das crianças para que possamos trabalhar. Mas a dor de me sentir impotente sobre o isolamento social me machuca.

Olhar cuidadoso e ajuste na rotina da casa

Desde que o isolamento social começou, tenho olhado com mais atenção para o comportamento dos meus filhos. Talvez o termo certo nem seja atenção, mas sim cuidado.

Entender que as mudanças de comportamento não são rebeldia, mas uma forma de expressar o que eles muitas vezes não sabem falar ou não conseguem compreender. Eles precisam sentir que suas dores não serão menosprezadas como mi-mi-mi. Estamos falando cobre confiança, sobre acolhimento e sobre amor.

Para amenizar o sofrimento das crianças, tenho conversados mais sobre seus sentimentos e com olhar bem atento para que suas dores sejam identificadas e validadas, afinal eles estão sentindo tudo isso e precisam entender que não é uma bobeira, mas um sentimento que precisamos aprender a lidar e resolver.

E sabe o que faz muita diferença? Dizer, com todas as palavras, que vocês vão passar por tudo isso juntos! Que seu filho pode contar com você, com seu colo e sua ajuda. Que não precisa ter vergonha ou esconder os seus sentimentos. Quanto mais entendemos nossos filhos, melhor será nossa ação para superar esta ou qualquer outra dificuldade que possa aparecer.

Quando nossas ações não estão surtindo efeito, a ajuda de um psicoterapeuta infantil é fundamental.

Um pouco de esperança em meio aos caos

Esta semana as aulas presenciais voltaram, ainda duas vezes por semana, e eles irão finalmente para a escola. Existem riscos, eu sei, mas, na minha visão maternal, são menores do que esses traumas que o isolamento social está causando aos meus filhos. Criança precisa brincar com crianças, precisa ter um espaço além da sua casa para aprender, para mudar, para crescer. E não se trata de achar culpados, mas de achar a melhor forma de cuidar dos nossos pequenos para que os traumas de hoje não perdurem.

Minha meta é que, daqui a alguns anos, toda essa pandemia seja uma história a ser contada, com muitos aprendizados, mas sem lágrimas nos olhos.

Monica Romeiro e seus filhos

*Por Monica Romeiro, Conselheira Maternal e escritora – Criadora do canal Almanque dos pais. 

youtube.com/almanaquedospais

Autora do livro: Vem cá me dar um abraço.

Capa do livro "Vem cá me dar um abraço"

Assista ao vídeo da Dra. Fernanda Viana sobre  Covid em crianças e se inscreva no canal do Papo de Mãe no Youtube: 

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