Há algumas semanas, nós da Política é a Mãe lemos uma reportagem do New York Times e ela não sai da nossa cabeça. De tão boa!
Política é a Mãe* Publicado em 05/03/2021, às 00h00 - Atualizado às 12h29
O título, em tradução livre, era mais ou menos assim: “Como a sociedade virou as costas pras mães: Não é apenas sobre ‘burnout’, é sobre traição.” Essa matéria (que pode ser lida aqui em inglês) faz parte de uma série em que o jornal analisou o efeito catastrófico da pandemia nas mães americanas – mas são impactos, medos, culpas e canseiras semelhantes à realidade de muitas mães brasileiras. Realidades muito mais graves, violentas e exaustivas para as mães negras e/ou as mães da periferia e em outros contextos de vulnerabilidade.
A cada linha você vai entendendo melhor de onde vem a raiva que tomou conta da gente em muitos dias dessa interminável pandemia. Como a gente acha que outras mães podem se identificar, fizemos aqui um resuminho bem livre dos pontos que achamos mais importantes.
Se você nunca se sentiu tão cansada na sua vida, nem no puerpério; se você tem momentos que fica paralisada ou passa algum tempo sentindo uma raiva monumental. Esses são alguns exemplos do peso esmagador na saúde mental das mães e isso vai além de um esgotamento mental. Esse cenário mostra que o que nos atravessa é sentimento de traição. Não é burnout, é uma opção feita por toda sociedade. Uma opção que ignora as mães. Isso porque enquanto o burnout, tem mais a ver com a reação individual e, no caso das mães, pode passar a ideia de que elas não são resilientes o suficiente, a traição aponta diretamente para as estruturas quebradas ao redor das mães.
Ok, agora vislumbramos essa possibilidade de entender melhor os impactos da enorme traição social que as mães sofreram no ano passado – e seguem sofrendo este ano. Boa. E agora? Isso resolve o problema? Não resolve, mas ajuda a suavizar os dias pesados demais. Segundo a reportagem, “ao reconhecer a natureza sistêmica do problema, as mães podem se libertar da culpa e do estresse que não merecem”. Aqui, nos ajudou bastante. Saber que não é culpa nossa por não conseguirmos ter leveza, por querermos sumir mesmo amando nossos filhos, por não conseguirmos acalmar crianças nervosas e exaustas por estarem há um ano longe da escola, por querermos berrar palavrões pra galera aglomerada no boteco. Não é falta de fibra, nem de amor aos filhos. É essa traição.
A reportagem faz um paralelo entre a situação das mães na pandemia e à que médicos/as vivem quando têm de fazer escolhas impossíveis, tipo decidir pra quem vai o remédio que está acabando. Assim, são os problemas do sistema de saúde que os impedem de fazer o que é o certo pros pacientes. Um profissional de saúde não deveria ser obrigado a escolher quem vai ficar no respirador. Nós mães, traídas pelo governo e pela sociedade como um todo, estamos sendo obrigadas a tomar decisões sobre questões que nem deveriam existir, como escolas abertas ou não, restringir o contato dos nossos filhos com os amigos ou não, conseguir manter o trabalho fora de casa ou não. No caso das mães e de médicos/as, ficam escancaradas as consequências de se optar pelo lucro a todo custo, seja no caso de planos de saúde como de governantes do país.
– Investir o pouco tempo que sobra no que nutre a nós, mães, de verdade. Exemplo? Conversar com as amigas. Pra gente funciona demais!
– Parar de incluir coisas na sua lista de afazeres; até “auto-cuidado” pode ser um trabalho a mais na sua vida.
– Reconhecer que esse problema é sistêmico e entender quais são as estruturas destroçadas que nos cercam. Isso é fundamental – aliás foi pensando nisso que fundamos a Política é a Mãe! Bora discutir quais são essas estruturas? No nosso instagram, puxamos esse debate “patriarcado” foi bem votado. Dentre muitos outros, claro!
– Canalizar sua raiva de um jeito pró ativo, diz a matéria. Ideia nossa: dá pra descontar a raiva cobrando os governantes nas redes sociais ou via telefone por melhores condições para escolas abrirem para aulas presenciais? Se juntar a outras mães para lutar? E, no fundo, vai ecoando aquele grito: “Companheira me ajuda, que eu não posso andar só. Eu sozinha ando bem, mas com você ando melhor.”
*A Política é a Mãe é um coletivo formado por mulheres mães que luta para que as vozes das mães e das crianças sejam ouvidas como ponto central nas discussões e ações relacionadas às políticas públicas da sociedade. Nos acompanhe pelo nosso instagram @politicaeamae, onde falamos de política, feminismo, maternidades, infâncias e cuidado.
Assista ao programa do Papo de Mãe sobre mães chefes de família: