Papo de Mãe

Como lidar com as crianças em tempos de isolamento social?

Para lidar com as crianças em tempos de isolamento social é recomendável que você, pai, mãe ou responsável, comece a se cuidar em primeiro lugar, isto é, do seu estado emocional.

Roberta Manreza Publicado em 06/05/2020, às 00h00 - Atualizado às 12h17

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6 de maio de 2020


Por Thais Rabanea*, psicóloga

Uma ameaça paira sobre as nossas vidas, expondo-nos à nossa vulnerabilidade e revestindo o nosso cotidiano de apreensão e incerteza. Com isso, os níveis de estresse e ansiedade aumentam, visto que todo nosso organismo passa a entrar em estado de alerta para poder enfrentar o desafio iminente.

Em limiares adaptativos, tal estado estimula condutas prudentes que podem preservar a vida do indivíduo e de sua comunidade. Entretanto, quando os níveis funcionais são ultrapassados, o estresse pode chegar à exaustão, bem como os sintomas de ansiedade podem se agravar, prejudicando o bem-estar, a saúde integral, a produtividade e até mesmo os relacionamentos interpessoais.

As crianças também estão imersas neste momento de apreensões e incertezas. A rotina diária foi alteradaElas olham para seus pais ou responsáveis e buscam respostas. O que está acontecendo? Eles são as referências que elas possuem para o enfrentamento da situação.

Logo, para lidar com as crianças em tempos de isolamento social é recomendável que você, pai, mãe ou responsável, comece a se cuidar em primeiro lugar, isto é, do seu estado emocional. Para tanto, pare por um instante.Perceba como se sente. De nada adianta verbalizar para uma criança que está tudo bem, quando estamos mais nervosos, irritados ou mesmo preocupados. Elas podem ficar mais agitadas e inseguras. As crianças tendem a ser bastante sensíveis à nossa comunicação não verbal, ou seja, à toda nossa expressão emocional que está além daquilo que verbalizamos.

É importante que os adultos investiguem como as crianças estão se sentido, o que sabem a respeito do que está acontecendo, quais são as suas dúvidas e dificuldades. Acompanhar as demandas permite adequar as condutas às necessidades específicas de cada criança, evitando, por exemplo, deixar lacunas de entendimento que podem ser palco para fantasias catastróficas que tendem a aumentar a ansiedade, ou mesmo, compartilhar informações que as crianças ainda não estejam prontas para assimilar.

Considerando as limitações e identificando as possibilidades, readapte a rotina da criança conforme a nova realidade, de modo que ela tenha as suas atividades e horários delimitados. Ensine-a a buscar fontes confiáveis de informações conforme a sua faixa etária. Aproveite esta situação crítica para que ela aprenda a discriminar fontes e conteúdos legítimos, a partir dos quais ela possa se atualizar e basear as suas reflexões.

Incentive o contato com amigos e colegas de modo virtual. Todavia, limite o acesso à internet e às redes sociais. Estimule o engajamento com atividades criativas que promovam o seu desenvolvimento, bem como o aprendizado e aperfeiçoamento de novas habilidades.


Procure inserir a criança nas atividades familiares para que ela se reconheça como parte integrante de uma espécie de “time de enfrentamento”, assim, compreenderá que as suas ações reverberam no todo. É um momento propício para se resgatar o altruísmo e contribuir para a formação de seu caráter, fortalecendo o seu senso de comunidade, para que ela entenda que todo indivíduo é um agente ativo no enfrentamento, superação e transformação social.

Permita que a criança expresse o seu medo mediante o perigo iminente ou ansiedade referente a possíveis desdobramentos futuros. Demonstre-se compassivo e acolhedor. Em seguida, apresente a função do medo e estimule uma canalização emocional construtiva, permitindo que o receio encoraja o cuidado, a cautela e a responsabilidade. Estimule a criança a focar no que ela pode controlar, em ações que ela possa realizar hoje, viabilizando que ela transforme o desconforto da ansiedade em ações estratégicas, prudentes e preventivas.

Cuide da alimentação e do sono da criança, além de adequar a prática de atividades físicas dentro das possibilidades. É imprescindível que ela mantenha hábitos saudáveis, evitando, especialmente, abuso de doces, horários irregulares para dormir e sedentarismo.

Estabeleça reuniões periódicas nas quais cada membro familiar, incluindo a criança, exporá o que está aprendendo com esta nova situação. Revestir até o acontecimento mais indesejável ou desconfortável de significado, possibilita a formação de um ser humano mais resiliente.

Por fim, mediante um desafio de tal magnitude, configura-se a oportunidade de preparar e fortalecer um indivíduo que inicia a sua jornada para as adversidades inerentes à vida humana. Ao capacitar a criança com recursos de enfrentamento para a situação atual, deixaremos um legado para que ela possa lidar com eventuais obstáculos ao longo de trajetória.

* Thais Rabanea é psicóloga, mestrem psicologia médica, pesquisadora no laboratório interdisciplinar de neurociências clínicas da Unifesp. Professora do curso de especialização em neuropsicologia do CDN (Centro de Diagnóstico Neuropsicológico). http://www.thaisrabanea.com.br/



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