Papo de Mãe

O decreto que legitima a discriminação

Não precisamos de um decreto que promova a segregação. A sociedade está carente hoje, mais do que nunca, de solidariedade, inclusão, de respeito ao próximo e de empatia. Tudo que vai contra isso precisa ser repudiado. As crianças precisam ter contato com as diferenças.

Roberta Manreza Publicado em 08/10/2020, às 00h00 - Atualizado às 12h04

Imagem O decreto que legitima a discriminação
8 de outubro de 2020



Por Thaíssa Alvarenga, fundadora da ONG Nosso Olhar

A minha rotina é a prova de que o Decreto nº 10.502, de 30 de setembro de 2020, que institui a “Nova Política Nacional de Educação Especial”, é um retrocesso.

A inclusão de alunos com deficiência é um desafio que escolas, pais e as próprias crianças enfrentam diariamente. É necessário ter um espaço adequado e profissionais capacitados. Esses estudantes têm direito à educação como qualquer outro. Após anos de luta para a garantia da inclusão, o presidente Jair Bolsonaro assina esse decreto, que legitima a discriminação e incentiva a segregação de estudantes com deficiência. Especialistas que convivem com a realidade refletem que a nova medida é um passo atrás nas conquistas que pautam a inclusão.

Sou mãe de Francisco, de seis anos. Ele nasceu com Down. O diagnóstico, ainda na gravidez, foi um impacto. Mas, aos poucos, entendi que o que cerca a síndrome é a desinformação. Por isso decidi fundar a ONG Nosso Olhar, que apoia e integra as crianças, jovens e adultos com Síndrome de Down. Depois vieram outros projetos com a mesma finalidade, o portal de notícias Chico e suas Marias (que são as irmãs de Chico, Maria Clara, de quatro anos e Maria Antônia, de três anos) e o recém-inaugurado Espaço Rede T21.

Quando Chico atingiu a idade escolar, foi matriculado e integrado numa escola tradicional. Ele é a prova de que a inclusão de pessoas com deficiência intelectual é o correto: dentro de casa ou com os colegas e os professores.

É preciso ressaltar a importância do desenvolvimento de uma sociedade inclusiva, que envolve todas as áreas – enfatizamos aqui, por conta da notícia factual que vem de Brasília, a de Educação. Todos têm direito a ela, com ou sem alguma deficiência. Os espaços têm que atender a todos.

Nós vimos com muita preocupação a “Nova Política Nacional de Educação Especial”, que vai contra a Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência e consolidadas na pela Lei Brasileira da Pessoa com Deficiência. Já que os direitos da pessoa com deficiência estão sendo ameaçados, não é demais falar que trata-se de uma questão inconstitucional. A “escola especializada” mencionada no texto representa, na verdade, uma separação. A criança com deficiência ficará fora da convivência e da inclusão. Isso é exclusão.

O decreto descaracteriza toda a luta de pessoas e entidades e provocou uma forte reação entre as entidades que lutam pela inclusão. Algumas escolas poderiam se aproveitar dele para barra a entrada de crianças com deficiência. Hoje as instituições de ensino são proibidas de recusar ou criar barreiras para a matrícula da pessoa com deficiência.

Não precisamos de um decreto que promova a segregação. A sociedade está carente hoje, mais do que nunca, de solidariedade, inclusão, de respeito ao próximo e de empatia. Tudo que vai contra isso precisa ser repudiado. As crianças precisam ter contato com as diferenças.



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