Papo de Mãe

Falta preparo de órgãos de saúde para lidar com histeria da gripe, diz médico

Roberta Manreza Publicado em 06/04/2016, às 00h00 - Atualizado às 15h04

Imagem Falta preparo de órgãos de saúde para lidar com histeria da gripe, diz médico
6 de abril de 2016


JAIRO MARQUES – Folha de São Paulo

O pediatra especialista em imunologia e alergia Victor Nudelman, 60, médico e ex-diretor clínico do hospital Albert Einstein, considera que está havendo uma “histeria” em busca da vacina contra a gripe e que órgãos públicos e privados não se preparam adequadamente para dar uma resposta rápida diante do atual surto da doença.

Pesquisador associado da Unifesp e membro de uma rede de referências mundiais de profissionais em imunologia, a Jeffrey Modell Fundantion, Nudelman avalia que as grandes manifestações ocorridas em todo o país podem ter ajudado a espalhar o vírus influenza e que doenças sazonais estão perdendo este caráter, aparecendo em todas as estações do ano.

“O fluxo de brasileiros indo e voltando para várias partes do mundo aumentou demais. Doenças consideradas sazonais estão perdendo esta característica”, diz.

Abaixo, trechos da entrevista concedida à Folha.

pediatra do hospital Albert Einstein Dr. Victor Nudelman (Foto: Divulgacao)
Dr. Victor Nudelman. Divulgação.

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Folha – A corrida dos pais atrás da vacina da gripe para os filhos é justificável?

Victor Nudelman – Existe um pouco de descontrole emocional em relação ao atual surto de gripe. É difícil para os pais entenderem se a situação está mais ou menos grave de fato e querem proteger legitimamente seus filhos. Mas essa quase histeria que acabou sendo gerada atrás da vacina é lição que tanto o setor público como o privado precisam aprender.

Os órgãos deveriam ter se organizado de maneira que fosse feita uma cobertura vacinal mais racional. A mídia ajudou a incendiar o pânico. Alertar que é preciso se proteger tudo bem, mas isso não quer dizer que a pessoa irá morrer se não tomar a vacina. Era preciso dar mais destaques para os grupos que realmente estão mais expostos a complicações e precisariam ser privilegiados, como pessoas com doenças respiratórias crônicas, por exemplo.

Para as entidades de saúde, essa antecipação dos casos de gripe H1N1 era conhecida?

Ao longo dos últimos anos, o fluxo de brasileiros indo e voltando para várias partes do mundo aumentou demais. O resultado que temos visto é que doenças consideradas sazonais estão perdendo esta característica. Está mudando a circulação e variações do rotavírus, temos gripes fortes no verão.

Neste ano, especificamente, com as grandes aglomerações reunidas em vários protestos, facilitou-se, talvez, um pouco mais a propagação de vírus. Mas que fique claro que não sou contra nem a favor de nenhuma manifestação.

Criança dentro das médias de peso e altura, tida como saudável, corre risco de desenvolver uma gripe grave?

Ela tem bem menos chance. Em 80% dos casos graves, a criança tinha uma doença de base que ajudou a provocar um quadro mais difícil.

A criança brasileira pega mais gripe e resfriado que as de outras partes do mundo?

Estamos dentro da média. Até mesmo os casos graves estão com padrões equivalentes aos de outros países.

O que uma escola infantil, um berçário, precisa fazer ao identificar um de seus alunos com H1N1?

Muitas escolinhas, para tentar ajudar um pouco os pais que não podem deixar o trabalho, acabam por aceitar crianças doentes e medicá-las. Diante do grande número de casos, esse tipo de medida não é aceitável. A criança terá de receber cuidados em casa.

Uma vez que se detecte um aluno com sintomas de algo que pareça uma gripe grave, ele precisa ficar longe das outras crianças e os pais devem ser avisados.

Que sinais indicam a hora de procurar socorro médico para a criança por causa de uma gripe ou resfriado?

Em uma situação mais delicada, em que há suspeita de algo incomum acontecendo, o primeiro passo é procurar o pediatra que normalmente atende a criança. Caso isso não seja possível, não se pode pensar que o cuidado médico pode ser dispensado.

Criança com febre alta e persistente, prostrada, precisa de atenção. Um sinal a ser observado é que quando a criança está com febre, normalmente, o coração dela costuma bater mais rápido e a respiração fica ofegante.

Quando se controla a temperatura, o quadro dela deve voltar ao normal. Caso isso não ocorra e a respiração esteja rápida, a boca comece a ficar arroxeada, deve-se ir logo atrás de socorro. Outro sinal importante a ser observado é quando a criança deixa de se alimentar direito.

Quando se trata de paciente com asma, de um bebê que nasceu muito pequeno ou que nasceu prematuro, por exemplo, o cuidado tem de ser redobrado e a busca pelo serviço médico precisa ser o mais breve possível.

A divulgação de informações erradas ou exageradas sobre doenças como a H1N1 nas redes sociais ou aplicativos chega a afetar o trabalho do médico?

Muito, pois alimenta a histeria entre as pessoas que começam uma corrida, às vezes sem sentido, aos prontos-socorros. O melhor é buscar conhecimento em fontes oficiais, como as dos governos.

Que medidas de prevenção contra a gripe são fundamentais para conter o surto?

Sempre lavar bem as mãos após o contato com as pessoas, sobretudo com aquelas que estejam doentes. O uso de máscaras por quem esteja tossindo muito também ajuda a diminuir a propagação do vírus. O uso de álcool em gel nas mãos também é indicado.

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